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Conheça Rogério Farias, o cearense de Nova Russas que criou o Troller, um dos carros mais desejados do mundo

FOTO: NATINHO RODRIGUES

Ele não costuma dar entrevistas, é discreto. É também engenhoso, tanto que desenvolveu lanchas, um carro anfíbio, além do buggy Fyber 2000 e Fyber 3000. O cearense de Nova Russas, Rogério Farias, remexeu na história do carro que o tornou conhecido no ramo automotivo, o Troller. A Ford comprou a fábrica em 2007, mas antes disso ele já não era mais sócio da marca 4×4. 

Rogério é administrador de empresas por formação e engenheiro mecânico por insistência. Conta que aprendeu a soldar, tornear e pintar para fazer o que ele mais sabe: criar. Muitos sabores, ralis e muitas histórias que o Troller lhe trouxe. Dinheiro mesmo, outras atividades lhe proporcionaram mais.

Bem de vida, hoje desenvolve elevadores e peças para parques de energia eólica. Mas essa é outra história. Quisemos mesmo saber como, com quem e com que dinheiro conseguiu tornar sua cria em um dos carros mais desejados para amantes de aventuras fora de estrada.

Rogério conversou com o Jornal O POVO.

O POVO – Como foi o estalo para criar e desenvolver o Troller?

Rogério Farias – Em 1994, eu comecei o projeto. Gostava de andar nas praias com lancha. Antes, podia. Mas o buggy não puxava a lancha como um 4×4. Eu imaginava em fazer um carro para andar nesse imenso litoral do Ceará. Então, eu desenvolvi um veículo com tração automática. Mas naquela época, você não poderia importar a parte de mecânica. Então foi o jeito eu fazer aqui. Consegui alguns protótipos. Cada vez que você tem uma decepção com uma peça, você também aprende. Quando você aprende, você melhora. Aí eu passei mais ou menos um ano e pouco fazendo esse carro.

OP – Qual era o tamanho da equipe?

Rogério – Como o dinheiro era meu para desenvolver o projeto, eu tinha que fazer uma coisa com a certeza de acerto. Aprendi a soldar, tornear, pintar, tudo que era preciso.

OP – Qual carro foi inspiração para o Troller?

Rogério – Já tinha nome e tudo. Em agosto de 1996, estava pronto o primeiro carro. Eu imaginava que tinha que ser um jeep e ser resistente. Não interessa o estilo dele. O cara que gosta não está muito preocupado com a aparência. Está preocupado se tem robustez e boa mecânica. Esse tipo de carro não tem boa aerodinâmica, porque é para andar no máximo a 100 km por hora. A inspiração foi o Jeep. O difícil é fazer o simples. A gente trabalha muito para fazer o simples. O Troller tem essa característica. Tudo é simples nele. 

OP – Quanto você investiu e como conseguiu o dinheiro?

Rogério – Eu tinha vendido outra fábrica que eu possuía e tinha US$ 1 milhão na época. Eu gastei tudo nos primeiros carros. Foi muito mais do que isso? Foi. Não sei quanto. Mas o meu US$ 1 milhão foi embora.

OP – Esse dinheiro voltou depois?

Rogério – Para o bolso não voltou. A vida da gente não é feita só de dinheiro. E o que eu vivi? E o que eu participei? E o que fui querido pelas pessoas por isso? Eu já vivia razoavelmente bem. Hoje também. 

OP – Como conseguiu sustentar uma fabricação em baixa escala de produção?

Rogério – Depois do carro pronto, pensei: “Como vou produzir isso?” Eu fazia um por semana, praticamente eu fazendo com mais duas pessoas trabalhando. Uma produção em baixa escala não tem sentido. Menos de 100 unidades por mês é um número muito pequeno para o mercado. Você vai comprar um motor, o fabricante não vende de pouco. Eu fui em uma fábrica em um México que fabrica sete mil e quinhentas caixas de marcha por dia. Quando eu disse que queria 100 caixas por mês… para eles lá, não faz a mínima diferença.

OP -E como você conseguiu abrir as portas no mercado?

Rogério – Eu conheci uma pessoa em Detroit, que estava em uma feira. O cara estava fumando em um cantinho. Eu cheguei lá. Minha mulher fala muito bem inglês. Pedi a ela para falar com ele, eu achava que era um vendedor. Era o presidente da Dana Mundial, Roy Mills. Eu contei minha história. Aí ele chegou e disse que ia me ajudar. Esse cara foi quem abriu as portas do mercado para mim.

OP – Que portas ele abriu?

Rogério – Se eu chegar de fora, em alguns lugares, ninguém nem me recebe. Precisa de um cartão. Eu cheguei em uma fábrica de homocinética e disse: “Eu quero essa peça aqui, mas eu quero uma borracha aqui.” Era uma mudança pequena. O cara me disse: “Nem pensar. Eu acho que não vou nem vender pra você a peça normal, quanto mais modificar”. Aí eu disse: “Não, rapaz, eu estive em Detroit com o Roy Mills.” Aí, ele: “Com quem? Tem o cartão dele aí?”. Fizeram cópia do cartão e disseram que fazia a peça para mim. 

OP – Que lembrança marcante você tem do Rally Paris Dakar?

Rogério – Tínhamos um piloto, que já morreu, chamado Arnoldo Júnior, que eu considero o melhor piloto de fora de estrada do Brasil. Esse cara foi para o Dakar com a gente. Eu fui para acompanhar. Ele poderia ter ganho o Dakar, mas por política, ele não ganhou. Não chegou em primeiro lugar, porque recebeu um rádio dizendo que ele tinha que ajudar os outros, tinham que chegar os quatro carros. Eu respeito isso. Chegaram os quatro carros inteiros e funcionando. De 250 carros que fazem um Dakar, chegam 40 ou 50 no final. A única experiência que tínhamos era as áreas da nossa praia e os pilotos que são muitos bons.

OP – Quando você vendeu totalmente a Troller?

Rogério – Rapaz, não me lembro, mas foi seis meses antes de vender para a Ford, que foi em 2007. Eu tinha 7% da Troller.

OP – Você já sabia que iria ser vendido para a Ford?

Rogério – Não.

OP – Valeu a pena todo o tempo e dinheiro que você investiu no Troller?

Rogério – Claro. Tudo que eu tenho hoje, essa vontade de viver, de crescer, de estar sempre presente em aventuras, tem a ver com isso. Eu fico cheio de sentimentos bons porque eu contribuiu um bocado para a felicidade de muita gente. Você fica pensando em fazer outras coisas melhores. 

PERFIL

Filho de “chefe de estação”, Rogério Farias nasceu em Nova Russas (cerca de 300 quilômetros de Fortaleza) no dia 7 de abril de 1958. Em Fortaleza, estudou no Liceu do Ceará e formou-se administração de empresa na Universidade Federal do Ceará (UFC). É divorciado e tem quatro filhos. Aprendeu a desenvolver carro na prática, pois não tem formação em engenharia mecânica. Seu pai é de Camocim e atuava como agente de estação. Viajava muito.

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